esse texto pode conter gatilhos - discussão sobre transtorno depressivo
quando falamos em depressão é comum vir à mente uma clássica caricatura: alguém introvertido, que não sai de casa, fica o dia inteiro de pijama na cama, sem interagir com outras pessoas, as vezes sem ao menos tomar banho. mas a verdade é que - apesar de isso ser real para alguns - grande parte dos casos não se encaixam nesse estereótipo.
a depressão, assim como muitos transtornos, pode se manifestar de diferentes formas. o seu amigo extrovertido, que vai a festas todos os fins de semana, pode ser depressivo. sua irmã - sempre arrumada, com unhas feitas e roupas engomadas - pode estar considerando suicídio. até mesmo aquele seu colega de classe engraçadinho, que faz piadas a cada oportunidade, pode estar lutando uma batalha que você não é capaz de enxergar.
nem sempre a dor é óbvia a olho nu. nem sempre você verá que alguém precisa de ajuda apenas observando-o.
em muitos casos essas pessoas conviveram com o transtorno por tantos anos que aprenderam a funcionar com ele, até porque o mundo não para porque você tem depressão. ainda há provas para estudar, dinheiro para fazer, responsabilidades a cumprir.
e, por mais que todos os ossos de seu corpo gritem para que você fique deitado na cama até se tornar parte dela e morrer de sede, às vezes você simplesmente não pode se dar ao luxo. então você se força. usa cada última grama de energia em seu corpo para levantar e ir ao trabalho, à faculdade, à escola, àquela festa de família ou aniversário.
você continua vagando pelo mundo, como se não houvesse uma estaca em seu peito impossibilitando sua respiração e drenando sua alma.
às vezes você finge por tanto tempo que se torna natural. e quando você conta para as outras pessoas sobre seu diagnóstico, elas se surpreendem. “nossa, mas você não parece ser depressiva”, “mas você é tão animada”, “nós não enxergamos isso em você”. foram alguns comentários desacreditados que ouvi de pessoas próximas.
os olhares de confusão que quase me fizeram gritar “brincadeirinha!”, e fazer de conta que tudo era uma piada de mal gosto fora do primeiro de abril.
me senti invalidada, como se a minha história não importasse, como se a minha batalha diária fosse irrelevante e meu diagnóstico, falso, apenas por não me encaixar em um estigma retratado pela sociedade.
será que sou mesmo tão depressiva assim? se saio de casa? se tomo banhos diários? se interajo com amigos e família? tenho hobbies?
mas então me recordo de todas as outras coisas, aquelas que as pessoas não veem. as crises de choro sem motivo aparente, a sensação permanente de desânimo e de que a vida não possui mais sentido algum. os pensamentos de tirar minha própria vida que me acompanham desde os 13 anos. a primeira tentativa aos 14, sobre a qual meus pais nunca ficaram sabendo. a segunda aos 19, que eles impediram.
abro diários antigos e leio pensamentos de uma garota sociável, que ia em todas as festas, que ria e fazia piadas incontáveis, só tirava notas boas. mas que, no silêncio de seu quarto atrás de uma porta fechada escrevia, desde cedo, sobre não ver sentido na vida. sobre um vazio na alma que ela era incapaz de preencher, fosse com pessoas, livros, álcool ou festas.
olho para aquela menina - que sofria tanto - e percebo que sim, a sombra da depressão já pairava sobre ela. assim como paira sobre tantas pessoas, que seguem com suas vidas aguardando o dia que o céu vai se abrir, e a luz vai entrar novamente.
“Eu vou voltar, eu vou voltar
eu vou voltar a ser feliz”
denso e sensível. chega a doer mas é um texto totalmente necessário. ainda tem quem não entenda a dimensão disso e acho que você destrinchou perfeitamente o que é e como acontece
eu rio muito e rio fácil, mas rir sempre foi uma distração. ser engraçada era minha forma de não deixar ninguém ver o que tava me consumindo. aprendi a viver com essa sombra. me identifiquei muito com tudo o que você falou em seu texto, Laís. e já fui os dois tipos: aquele que não sai do quarto, que se isola, que preocupa, e aquele que está pensando em como seria melhor não estar viva enquanto come pizza com as amigas e joga conversa fora.